"Na selva de pedras, resiste uma flor"


QUE HORAS ELA VOLTA? (2015)
Direção: Anna Muylaert
Elenco: Regina Casé, Michel Joelsas, Camila Márdila, Karine Teles.

                                 ロロロロロ

Só à arte tem à capacidade de elevar à simplicidade à um estágio de extrema riqueza. Somente à arte mergulha no nosso aglomerado universo emocional e lá faz enternecer as emoções que nós, sujeitos tão enraizados no solo da realidade, já não somos mais capazes de deixar florescer. Apenas a arte revela Regina Casé, grande atriz, grande mulhé. O que se finaliza em Que horas ela volta? É a sua sutileza, delicadeza, pureza e qualquer outro adjetivo que tenha um caminhar pelo terreno da genuinidade.

Na selva de pedras, resiste uma flor. Quão deslocada ela é sendo tão sensível, se vendo em espaço tão resistente, indisposto ao amor.  Val, a mulhé nordestina que trabalha em uma casa de alta renda, que estrutura a mansão da família... Desestruturada. Val que não sabe o que é vestibular, muito menos Arquitetura e Urbanismo, mas que se lança na vontade da filha, como dona do sonho da cria. Se for a vontade de Jéssica, que assim seja. “Boa sorte, fia!”, grita a mãe, embaixo de chuva, pois é do nordeste, onde mais se tenta a sorte nesse Brasil.

Anna Muylaert entrega uma comédia dramática que divide, na mesma sala, o público entre o tocante e o alegre, com lágrimas que se confundem entre o choro e o riso. A inteligência técnica na câmera da diretora, ao criar os enlaces de dois tipos de mães, refletindo dois tipos sociais, constrói a sutileza crítica que faz muitos rirem do próprio crime, como opressores que se denunciam em suas risadas. Regina Casé − em um deslumbre de atuação − com seus passos cansados nos chinelos rastejantes ao chão, de corpo travado e gestos tão bem encaixados nos timings de suas falas, registra o amor às raízes − ainda que raízes sofridas – como resultante das cruzes de tempos difíceis de outrora, de outro lugar que dava como melhor alternativa a fuga e a dor da saudade.


O nosso representante na corrida do Oscar de 2016 não se diminui por ser um exemplar da típica frase de já ser um vitorioso, ainda que não venha a ser indicado. É um filme para a vida. É um filme para a história.

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